“No concelho existe uma cultura desportiva superior ao que é normal em Portugal”

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A referência pertence ao professor Dimas Pinto, natural da Póvoa de Varzim, especialista na área da gestão desportiva. Antigo praticante e treinador e principal impulsionador do basquetebol na década de 70 no CDP, colaborou com a Câmara da Póvoa ao coordenar o gabinete de desporto no último mandato de Manuel Vaz e nos primeiros anos da gestão de Macedo Vieira. O atual presidente da Associação Portuguesa de Gestão do Desporto (APOGESD), espera que as subidas de equipas locais à 1ª Divisão permitam aos jovens uma maior “motivação para a prática de qualidade se for acompanhada ao nível das suas modalidades, nos seus clubes”.

O que representa para a Póvoa de Varzim as subidas do Póvoa Andebol e do Voleibol do CDP, e a presença na fase de subida do Basquetebol do CDP?

No presente, representa um bom momento do desporto sénior na Póvoa, representa o sucesso de alguns agentes desportivos, dirigentes, treinadores e também alguns pais de atletas que merecem a minha admiração e respeito, porque num contexto particularmente difícil da nossa sociedade e até em alguns casos do próprio clube, souberam trabalhar para garantir as condições que proporcionaram estes resultados. Uma palavra muito especial para o Póvoa Andebol, para asua equipa diretiva que apresenta
um jovem clube em continuo crescimento e afirmação no contexto local
e nacional. É, por isso, um momento importante de celebração num Concelho que aposta na cultura e no Lazer e que tem no desporto, no seu sentido mais plural, um suporte importantíssimo para a concretização desse projeto.
No futuro, pode trazer um aumento de visibilidade e com a visita de clubes de maior expressão, mais interesse na prática destas modalidades e mais visitas à nossa terra, com o impacto positivo que daí pode resultar.
Para os mais jovens, interessados em prática desportiva e num percurso para o alto rendimento, a oportunidade de assistirem a jogos com melhor nível e com praticantes de grande qualidade, pode aumentar a sua motivação para a prática de qualidade, se for acompanhada ao nível das suas modalidades, nos seus clubes, por programas de formação que construam e reforcem uma identidade local, inseridos em planos de desenvolvimento sustentáveis, só possíveis quando os vários fatores do desenvolvimento desportivo nomeadamente: Quadros Humanos (treinadores devidamente habilitados, dirigentes qualificados, pais de atletas) Governança, Instalações adequadas, Apetrechamento, Financiamento, Legislação, Gestão, Orgânica, Atividades/Serviços, Marketing, Formação, Documentação e Informação estão presentes nas nossas organizações.

Com duas equipas nas divisões principais e outras equipas em escalões secundários (basquetebol, futsal e futebol), a Póvoa de Varzim revela o bom trabalho no desporto local e também na Formação?

Que se tem realizado um bom trabalho no desporto local é verdade, a Póvoa através das suas políticas desportivas, tornou-se uma cidade com um ambiente privilegiado para a participação desportiva, é fácil encontrar locais (instalações artificiais, espaços naturais, espaços públicos) e ofertas desportivas com grande capacidade de atração quer para o desporto formal quer informal, para todos os escalões etários independentemente do género e até no que diz respeito ao desporto inclusivo.
Dizer que as equipas a participar nos escalões principais revelam um bom trabalho na formação dessas modalidades não me parece fácil de concluir. Olhando para o número de jovens poveiros que integram essas equipas, rapidamente se percebe que são muito poucos, em algumas dessas modalidades não estão sequer representados, e os que lá estão não são resultado de um trabalho consistente, continuado e intencional dos clubes, criando uma cultura de trabalho para a excelência nos escalões de formação. Nos nossos clubes, as nossas modalidades não apresentam em todos os escalões e particularmente nos de maior proximidade aos seniores resultados e atletas que consigam uma rápida integração nesse escalão e ainda menos no alto nível. Mesmo no Basquetebol, onde essa vontade e preocupação é mais evidente graças à qualidade inequívoca trazida pelo
Prof José Ricardo com influência geral na secção, esse programa de
formação ainda não consegue alimentar uma equipa sénior para participar em quadros competitivos de maior exigência, são precisos anos continuados de trabalho de excelência.

Este é o momento mais alto do desporto de alta competição na Póvoa
de Varzim?

É talvez o de melhores resultados no desporto federado de desportos coletivos. Não se pode falar propriamente em alta competição, esta, inserida no desporto de alto rendimento, obriga à evidência de talentos e de vocações de mérito desportivo excecional, aferindo-se os resultados desportivos por padrões internacionais, sendo a carreira dos atletas orientada para o êxito na ordem desportiva internacional. Mesmo os nossos clubes mais representativos não apresentam uma estratégia com uma Visão
e Missão que persigam a alta competição. Os atletas poveiros com reconhecido talento quase sempre tiveram que procurar concretizar o seu percurso no alto rendimento/alta competição fora do concelho ou do país, o que na nossa realidade é o que acontece sem que isso possa ser considerado uma calamidade. Na alta competição, trabalha-se diariamente, por vezes duas vezes ao dia, com equipas técnicas multidisciplinares altamente qualificadas e profissionalizadas, em contextos com enquadramentos materiais e de apoio ao treino de excelência. O trabalho das nossas equipas dos patamares superiores de rendimento não se desenrola nestes contextos e exige estar em permanente superação, sabendo que não é fácil manter de forma sustentável os níveis competitivos que, com mérito, foram alcançando. No entanto, a situação atual, de posicionamento de sucesso destas modalidades, requer uma reflexão imediata para antecipar o que se pode e deve fazer para garantir a sustentabilidade destes projetos, quer desportiva quer financeira. Sabemos que no Concelho existe uma cultura desportiva superior ao que é normal em Portugal, então se compararmos com a dimensão populacional, certamente estaremos no topo. Desta forma, devemos começar já a trabalhar com todas as partes interessadas de forma
coordenada e eficiente, nomeadamente com as escolas, clubes de formação e autarquia, para que estes projetos tragam no futuro um pipeline de atletas de qualidade que mantenha a médio e longo prazo esta situação meritória que se alcançou.

Que fatores são essenciais para a manutenção destas equipas na 1ª
divisão e que outras possam também alcançar este patamar?

O mais importante é que se tornem projetos sustentáveis que o
seu trabalho seja reconhecido no cumprimento da sua missão institucional, pelo impacto do seu serviço à comunidade, pela responsabilidade social, com dirigentes com formação que sejam responsáveis por uma boa governação monitorizada através de indicadores que avaliem o trabalho realizado não só na perspetiva das classificações alcançadas porque o sucesso de uma equipa, de uma secção, de um clube está muito para lá do
resultado no marcador eletrónico. Que se tornem clubes de praticantes, com um bom programa de comunicação, prontos para a inovação assente num conceito de desporto aberto, se tornem clubes de proximidade com a população e com as instituições, por exemplo com o desporto escolar, com
recursos (humanos, financeiros e materiais). Existem três tipos de clubes; os que observam o que está a acontecer: os que se questionam sobre o que está a acontecer e os que fazem as coisas acontecerem, só estes últimos conseguem chegar a estes patamares e manter-se lá.

A autarquia está a investir em infraestruturas. As mesmas vão acompanhar o desenvolvimento do desporto de alta competição na Póvoa de Varzim?

A Póvoa é uma das cidades, na região e até no país, que se apresenta bem servida de instalações para a competição desportiva e até em algumas modalidades para a alta competição. Foi dos primeiros concelhos do país a ter uma Carta Desportiva que levou à concretização de um plano diretor de instalações para responder às necessidades identificadas e que conduziu a
um aumento da oferta desportiva, com consequências no incremento da participação desportivas dos poveiros em todos os âmbitos de prática e na melhoria da qualidade de vida da população. Daí não estranhar que, face ao aumento do número de Clubes, de modalidades, equipas, de praticantes, se faça sentir de novo um défice de espaços que retira qualidade de prática a
esse crescimento. Alguns dos equipamentos que estão anunciados vão reduzir seguramente um défice de satisfação com instalações desportivas em algumas tipologias, particularmente pavilhões, garantindo mais espaços de treino.
Para responder com mais rigor a essa pergunta precisávamos, num momento em que as cidades e territórios lidam com o desporto de maneira abrangente colocando-o em relação com outras políticas, partir para uma reflexão sobre as áreas prioritárias de intervenção, o que gostávamos de fazer com base nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), convencidos de que precisamos do desporto para tornar esses OBS próprios (vida ativa e saúde; desporto, educação e cultura; desporto e ambiente; desporto e coesão social; desporto e igualdade; desporto e desenvolvimento económico; desporto e governança) e servir como elemento da evolução das cidades, da nossa em particular, para modelos sustentáveis.