As eleições autárquicas de 2025 não serão apenas mais um exercício democrático: serão um teste à vitalidade da nossa democracia local e um espelho da insatisfação popular. E, neste espelho, os partidos que há décadas dominam a política nacional não saem favorecidos.
O crescimento do Chega é sobretudo, reflexo de um cansaço coletivo. Não se trata apenas de um voto de protesto, mas de um voto de rutura – uma reação contra a gestão morna, o discurso previsível e as promessas adiadas. André Ventura soube explorar esse descontentamento e, na Póvoa, o partido procura capitalizar nele apresentando um leque de propostas que vão de menos burocracia municipal à prioridade aos residentes na atribuição de apoios, atração de mais investimento nas freguesias e até uma passagem subterrânea para aliviar o caos na entrada norte da cidade. A coerência e exequibilidade destas medidas é, no mínimo, questionável — tanto pela sua falta de sustentação individual como pela ausência de uma visão integrada. Ainda assim, acabam por cumprir o objetivo imediato: mobilizar o eleitorado.
Já o Partido Socialista, abdicou da sua identidade para se juntar a dois partidos marginais na esperança de ter mais alguns votos, sem ter a capacidade de perceber que quanto mais à esquerda, mais o PS perde votos num concelho conservador como o nosso. Ainda assim, consegue apresentar propostas meritórias — habitação a preços controlados, transportes públicos mais eficientes, criação de mais creches públicas, mais espaços verdes no centro da cidade e apoio reforçado às associações culturais. Mas tudo soa a “déjà vu”. O PS Póvoa parece mais preocupado em apresentar um programa “politicamente correto” do que em explicar como vai concretizá-lo e financiá-lo, depois de anos a perder terreno e a ser incapaz de capitalizar o desgaste do PSD no poder. A experiência mostra que um discurso centrado apenas na denúncia raramente é premiado pelos eleitores. As pessoas não votam em quem lhes recorda diariamente que tudo está mal, votam em quem lhes apresenta uma solução para melhorar o que existe.
Do lado do PSD, a situação é paradoxal. Governa, mas dá claros sinais de fadiga. O executivo social-democrata insiste no discurso do crescimento económico, quando durante décadas este tem sido o seu maior handicap, fala da aposta no turismo, mas pouco ou nada tem sido feito, principalmente a norte do concelho, e ainda da modernização da rede escolar, mas falha em inspirar, em inovar! É uma governação que se confunde com gestão corrente, sem visão transformadora. A sensação é de que o PSD local administra, mas não lidera, vai tapando buracos. O anúncio de um parque subterrâneo no centro da cidade é exemplo disso mesmo, parece mais uma resposta apressada a um problema imediato do que parte de uma visão estratégica. E é precisamente esse vazio que abre espaço para que partidos radicais ganhem força — não por mérito próprio, mas porque os partidos tradicionais desistiram de emocionar os eleitores.
As autárquicas de 2025 na Póvoa serão, portanto, um momento de clarificação. PS e PSD têm de provar que ainda são capazes de falar ao centro e oferecer soluções concretas, não apenas slogans. Caso contrário, arriscam-se a assistir, de braços cruzados, à entrada de um novo ator político na Câmara, com todas as incertezas que isso traz para a governação municipal.
O que está em jogo vai além de um simples resultado eleitoral: é a definição do rumo que o concelho quer para a próxima década. Continuar com a gestão burocrática de sempre, apostar numa tentativa de renovação socialista ou arriscar uma rutura com o Chega — estas são as escolhas. O pior cenário seria a abstenção decidir por nós.
Artigo de opinião de Ivo Maio.