A Vitória Anunciada e o Elefante na Sala

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As eleições presidenciais reelegeram o professor Marcelo Rebelo de Sousa. A vitória já anunciada (inclusive por Marisa Matias no seu debate contra Marcelo Rebelo de Sousa) fez com que durante estas eleições o foco fosso colocado em quem conseguiria alcançar o segundo lugar. Ana Gomes, candidata do espectro socialista mas que formalmente só recolheu o apoio do Livre e do PAN, acabou por assegurar o segundo lugar (12,97%), logo seguida de André Ventura (11,90%).

Os representantes dos partidos mais à esquerda asseguraram cerca de 8% dos votantes. João Ferreira (4.32%) acabou por ficar em quarto e Marisa Matias (3.95%) terminou em quinto lugar, ficando bastante distante do resultado alcançado pela mesma nas passadas eleições presidenciais (10,12%).

Por fim, o candidato liberal Tiago Mayan Gonçalves (3,22%) e Vitorino Silva (2,94%) fecham os resultados eleitorais onde, e mais uma vez, a abstenção saiu vencedora (60.7%).

Estando os resultados apresentados, mais do que perceber quem ganhou e quem perdeu nestas eleições, importa destacar que a grande maioria dos portugueses que se deslocaram às mesas de voto (os que felizmente conseguiram sair de casa, não estando em isolamento e tendo ficado assim impedidos de votar) ainda colocaram o “X” em candidatos convencionalmente caracterizados como pertencentes ao “sistema”.

E, como é possível agora constatar, a moderação ainda continua a ser o principal adversário à escalda (inegável) do Chega! de André Ventura. Marcelo Rebelo de Sousa desconstruiu, no campo das ideias, todos os chavões utilizados pelo candidato que acabaria por ficar em terceiro lugar. Extremar o discurso (como aconteceu com Marisa Matias e João Ferreira) apesar de tentador, acaba por ser a prova que os extremos se tocam e onde existe muito barulho, acaba por sair beneficiado quem está habituado a gritar.

Ainda assim, se a moderação é a melhor resposta, importa perceber o que leva quase meio milhão de pessoas a votar em André Ventura. Não são todos racistas, não são todos xenófobos e no fundo, querem uma mudança de sistema sem perceber que o Chega! é composto pelo pior que o sistema oferece. Cabe aos partidos convencionais sair do seu pedestal, e tentar dar respostas às perguntas feitas pelos portugueses que acabam por sentir que apenas o André Ventura os pode representar.

Mas atenção, o líder do partido Chega! é o expoente máximo de populismo e aproveita-se da aparente falha dos partidos tradicionais no processo de mediação entre a política e os cidadãos, o que gera sentimentos de revolta no seio da população. E, numas eleições marcadas, claramente, pela pandemia, onde o Partido Socialista não apresenta um candidato e existe alguma descrença geral na oposição à direita, André Ventura habilmente se apresentou como o único capaz de ocupar esse espaço vazio.

Assim, o que se deve retirar destas eleições é que o status quo do sistema político parece prevalecer. A moderação deve ser sempre a resposta à ascensão de movimentos extremistas e a cultura de cancelamento só contribui para que esses movimentos ganhem mais força. Por fim, e apesar de haver a necessidade de assegurar que o movimento político de André Ventura não continue a crescer, está na altura de o tratarmos com a proporcionalidade que tratamos a Iniciativa Liberal ou o Livre (antes de Joacine Katar Moreira se tornar deputada não inscrita), como partidos que têm um único representante no parlamento e não mais do que isso.

João Magalhães