À data do envio deste artigo para edição já perdi a conta às urgências que estarão fechadas nos próximos tempos. E, ainda que este não seja o motivo deste artigo, a causa é a mesma: falta de organização decorrente da falta de prioridades. Por exemplo, recordemos quanto tempo se passou a discutir se os privados ou o setor social deveriam ter um papel importante na Lei de Bases da Saúde e quanto tempo se passou a discutir de que forma a população teria acesso a melhores cuidados de saúde.
Se é inegável que o SNS deve ter um papel e peso importante na prestação de cuidados de saúde, não será menos verdade que o SNS não é um fim em si mesmo. É um meio. Foi a fórmula encontrada para garantir o maior e melhor número de prestação de cuidados de saúde ao maior universo de cidadãos possível. E essa é a prioridade: garantir que o maior número de pessoas possível tem acesso ao maior e melhor número de cuidados de saúde.
O problema da saúde é apenas mais um reflexo da ausência de estratégia clara do país quanto aos setores onde deve apostar e como deve apostar. Não será por isso de surpreender que quando o objetivo não é claro, natural será que os resultados não sejam os ideais.
Assumindo que parte do problema se trata de uma organização desadequada às necessidades da população e aos tempos modernos, a primeira atitude deve ser: como e com quem vamos solucionar os problemas? Tendo em conta o cenário da transferência de competências dos municípios, talvez seja a hora de a tutela deixar de parte a arrogância impositiva do pacote da descentralização e tomar uma atitude de cooperação com os seus parceiros: os municípios. Em paralelo, os municípios deverão tomar a iniciativa de analisar a morfologia da população e perceber não só quais os cuidados mais prementes, como também a fórmula mais ajustada de servir as necessidades de saúde da população.
O caso da saúde é um dos exemplos recentes em que a falta de prioridades acaba por redundar em falta de organização. Em qualquer estrutura, quando as prioridades não são claras, a mesma acaba por se fechar e gerir com foco na sua lógica interna, ao invés do seu objetivo.
Em consequência, uma das fórmulas imediatas para retirar os holofotes dos problemas é o de investir forte numa política de comunicação que se foque em passar uma determinada mensagem ou em gerar contrainformação que permita diminuir a perceção do problema. Mas ainda que a perceção possa mudar, o problema não muda, muito menos se resolve.
E toda esta miscelânea para chegar àquilo que me levou a escrever e a colocar em perspetiva: o investimento do governo num diretor de comunicação e o investimento para conceber o PRR.
Fui e serei um defensor do PRR (aliás, na Póvoa fiz parte do trabalho do PRR com duas das pessoas com quem partilho este espaço de opinião), mas já não o consigo ser da metodologia adotada para a sua constituição. Todavia, reconheço um mérito: o de o Governo colocar na pasta da economia o pai do PRR. Mas questionemos:
O que é mais importante para o Governo? O futuro do país ou a comunicação? Tivemos notícia do elevado investimento que o Governo fez para o seu novo responsável de comunicação (terá uma retribuição próxima à de um secretário de estado), mas também soubemos que o pai do PRR não recebeu qualquer valor para fazer aquele que é o programa de maior importância para o país na próxima década.
Para mim, é inequívoco que se trata de uma clara ausência de prioridades. O PRR deveria ter tido um elevado orçamento para a sua concepção e deveria ter um gestor de topo que acompanhasse não só a execução, mas que o pudesse recalibrar indo de encontro às necessidades e potencialidades da economia portuguesa. O PRR terá 3 vezes e meia a dimensão do apoio estatal à TAP, pelo que não se compreende como a TAP recruta uma gestora altamente especializada (e bem), mas quanto ao PRR se cria uma estrutura de missão em comissão de serviço.
E, enquanto o País não perceber que é preciso ter prioridades claras que permitam enriquecer e melhorar a vida dos portugueses, continuaremos desnorteados pelo excesso de comunicação e frustrados pela falta de resultados.