No artigo deste mês relembro a D. Maria Azevedo dos Santos que tive a honra de conhecer pessoalmente. De trato gentil, sorriso aberto e detentora de uma memória excecional. Nascida a 19 de março de 1921. Natural de Argivai, Maria Azevedo dos Santos casada com António Lopes da Costa, Ferroviário de profissão, carpinteiro e também, agricultor.
Maria Azevedo foi uma senhora cujas atividades principais passavam por ser doméstica, lavradeira, costureira, dedicando-se ainda, e apaixonadamente à floricultura. Lembro-me de ver Maria Azevedo, já com avançada idade, tratar das flores com o cuidado de outrora. Em tempos idos, essas flores, eram por ela, vendidas no mercado da Póvoa de Varzim. Às sextas-feiras fazia a feira de Vila do Conde onde vendia os produtos hortícolas como os grelos, os repolhos e também os animais como coelhos e galinhas criados em casa. Sabemos nós que para esta feira em Vila do Conde, os vendedores tinham de marcar lugar, logo bem cedo, de madrugada. Assim era todas as sextas-feiras. Como lavradeira cuidava diariamente das três ou quatro vacas, dos coelhos, das galinhas, dos perus e do porco caseiro.
A sua máquina de costura Singer era um instrumento de trabalho de grande valor, como para tantas outras senhoras desse tempo. Nela costurava, principalmente no inverno, não só a roupa para o seu próprio uso doméstico, como a dos seus filhos pequenos e arranjos na do seu marido, além de fazer os cortinados das janelas de quartos e de salas. Maria Azevedo dos Santos foi uma profunda ativista das causas religiosas, tendo sido durante vários anos zeladora na Capela da Nossa Senhora do Bom Sucesso do altar da Nossa Senhora do Bom Sucesso e mais tarde na Igreja Paroquial de S. Miguel de Argivai, como zeladora responsável pelo altar do Sagrado Coração de Jesus. Pertenceu ao grupo de mulheres argivaienses que em serões, faziam centenas de flores em papel unidas por arame e que embelezavam os postes desde a Capela da Nossa Senhora do Bom Sucesso no Largo do Terreiro ou da Igreja Paroquial até ao Largo do Padrão, em dias de festa.
Um exemplo de uma Mulher que viveu em tempos árduos. Numa época em que as mulheres trabalhavam de noite e de dia, com infindáveis tarefas como a ordenha das vacas, cujo leite era levado para o posto da freguesia e parte, vendido a clientes que a procuravam em casa. Cozia pão de milho muito saboroso no forno a lenha. Tempos em que para se conservar as carnes fazia-se a salga da carne do porco e nos meses de inverno a salga da sardinha. Preocupava-se com a plantação de cereais e de produtos hortícolas, com a manutenção do gado, plantação e apanha da batata e outros trabalhos agrários. Era costume à sexta-feira cegar erva suficiente para os animais comerem nesse mesmo dia e durante o fim-de-semana. A relação de respeito para com os animais era muito forte, basta bem lembrar a adoração ao Santo António, padroeiro dos animais. Quando estava para acontecer um parto, as pessoas revezavam-se em turnos noturnos, de modo a acompanhar o nascimento das crias e em casa, na “ Sala do Senhor”, acendia uma vela de adoração e proteção ao Santo.
Tive o imenso privilégio de falar com ela várias vezes, confidenciou-me ser uma leitora assídua de jornais e atenta a todos os órgãos noticiosos, reveladora de uma memória extraordinária, foi uma das fontes mais preciosas para a recolha de património imaterial da monografia de Argivai. Maria Azevedo dos Santos faleceu a 12 de abril de 2019 com 98 anos.
Sofia de Azevedo Teixeira