Pegasus – o dilema entre segurança e privacidade

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Já não é a primeira vez – e certamente não será a última – que o sistema Pegasus, da empresa Israelita NSO faz capas de jornais com chefes de estado, políticos e jornalistas que viram o seu telefone controlado através do sistema Pegasus. Quanto ao recente caso espanhol abordaremos mais à frente (é um exemplo perfeito do dilema que nos é apresentado).

Simplificando, o software Pegasus é um programa que é infiltrado nos dispositivos móveis e que dá acesso a toda a informação que está ou esteve gravada no dispositivo, por quem infetar o referido dispositivo.

Aquando da minha visita a Israel tive a oportunidade de visitar a sede da empresa que vende o Pegasus, onde a Diretora Executiva e o Diretor de Compliance nos deram uma visão abrangente do serviço prestado, bem como se disponibilizaram para perguntas e respostas ao longo da exposição.

Em primeiro lugar convém esclarecer dois pontos prévios muito importantes. Primeiro, esta empresa está no segmento BtoG, isto é, só faz vendas do produto a governos ou agências governamentais (ex: FBI nos Estados Unidos, PJ em Portugal, CNI em Espanha, etc) e segundo, cada venda que é efetuada tem de ter a autorização expressa do Estado de Israel.

O caso que voltou a trazer o Pegasus para as luzes da ribalta ocorreu em Espanha. Começou pela divulgação de notícias de que vários elementos que fizeram parte do movimento independentista catalão haviam sido monitorizados com aquele sistema. Poucos dias depois, era tornado público que foi possível verificar através de uma perícia que Pedro Sanchéz e Margarita Robles (Primeiro-ministro e Ministra da Defesa) haviam sido vítimas desse mesmo programa, nos telefones de trabalho. Tirando o facto de nos dois casos ambos terem sido infetados, tudo o resto é diferente.

No caso dos 18 ativistas catalães que viram os seus telefones espiados, o mesmo foi feito pelo Centro Nacional de Inteligência através de autorização judicial, ou seja, seguindo e respeitando as regras do Estado de Direito. Convém recordar que o movimento independentista catalão colocou em causa os princípios de unidade territorial do Estado espanhol, bem como provocou um clima de perturbação da ordem pública e de erosão no papel do estado como já não se via há décadas. A tudo isto, importa sublinhar que as permanentes ameaças dos movimentos independentistas, no meu entender, justificaram a medida de investigação até ao último detalhe dos envolvidos no processo de independência catalão.

Por outro lado, o telefone de Pedro Sanchéz (tanto quanto foi possível apurar) terá sido infetado pelo Estado Marroquino, em Junho de 2021. A atitude do estado marroquino deverá estar ligada ao apoio dado pelo Estado espanhol ao Líder da Frente Polisário Brahim Gali que esteve hospitalizado em Espanha. E qual o relevo?

Ora, um dos objetivos da utilização do sistema Pegasus é o de auxílio à investigação de crimes de terrorismo. A Frente Polisário que luta pela independência do Saara Ocidental e do qual Brahim Gali é o seu líder é considerado um grupo terrorista pelo Estado Marroquino. Só poderá ter sido esta a justificação plausível, por banda do estado Marroquino. Note-se que ainda que possa ser plausível, é totalmente inaceitável.

Tanto quanto me foi transmitido em Israel, em caso de violação das regras contratuais pelos clientes, o contrato é terminado pela NSO e os clientes perdem o acesso às atualizações de software que o programa vai tendo. E, sem as atualizações permanentes o Pegasus torna-se obsoleto, na medida em que não consegue desencriptar as novas atualizações das aplicações.

Quanto ao Pegasus o debate em Portugal tem-se circunscrito à habitual conversa de que este tipo de programas não pode, nem deve ser usado, a maior das vezes associado a uma tremenda demagogia. Demagogia essa próxima dos que diziam que não se devia gastar em armamento porque devemos lutar pela paz (Putin fez questão de lembrar que o mundo não é um conto de fadas).

Quanto a essa generalidade de opiniões, não poderia estar mais em desacordo. Sempre respeitando as regras do estado de direito, em matérias que coloquem em crise o Estado de Direito ou de crimes contra o Estado, Portugal deveria utilizar e adotar o Pegasus. Um país que (bem) se tem virado para o Turismo e se quer colocar no panorama internacional através da realização de grandes eventos, não pode ficar no escuro em matéria de investigação criminal e terrorismo.

Porque se é verdade que o Pegasus foi por vezes mal utilizado é igualmente verdade que já evitou dezenas de atentados terroristas, já ajudou a deter pedófilos e redes de tráfico de drogas e pessoas.

E para o leitor? Entre segurança e liberdade, onde deve ficar Portugal?