Vá, domingo, escolha o novo senhor das medalhas!

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JOSÉ ANDRADE

Depois de dez anos com o afecto e devoção com que elegeram e zelaram pela múmia que vagueou pelo palácio de Belém, as boas almas indígenas portuguesas, no próximo domingo, vão com a mesma mesma devoção poder escolher um novo candidato. Pelo entusiasmo da campanha, a coisa não promete nada de interessante, quer dos candidatos, mais dados a dizerem vacuidades entre um pastel e uma beijoca, quer por parte da populaça, que olha a escolha, com a mesma sublime vulgaridade com que discute e se interessa entre quem entra ou sai nos participantes da vacaria na TVI. Parece que como na ‘quinta’, escolher um Presidente da República, tem tanto de importância e interesse, quanto o de só entreter o pagode, daí que ao ‘bom povo’, tanto se lhes faz quem seja o indigente escolhido para tratar dos animais, cavar o jardim e animar o ambiente. E já nem discutem o preço. E como é caro manter o tratador do Palácio de Belém. Tão caro, que é seis vezes mais caro que a realeza espanhola. Mas isso pouco conta, cá o regime até é republicano, e o bom português gosta de uma boa história, muito sórdida se possível, mas onde os ‘bons malandros’ saibam jogar com as palavras que gostam de ouvir.

E eles, os ‘bons malandros’, aí estão, para gozo de uns tantos, e muita tristeza de muitos mais. Um mano a mano, só que com dez candidatos para todos os gostos, cores e paladares.

Fatal como o destino, neste caso o destino é ditado por imperativo legal e constitucional, domingo, a rapaziada mais dada a estas coisas da clubite partidária, já tem aprazada a romaria que os volta a levar à escolha do novo espécime que vai ocupar a gaiola dourada junto aos Jerónimos. E não vale dizer que são candidatos a mais. São dez, o que comparado com a ida às urnas de Outubro passado, em questão de números, até é nem é coisa por demais.

Com a função presidencial a viver o grau zero de importância, interesse e popularidade – Cavaco foi um bom e generoso coveiro – daí não admirar a inutilidade em que é tida, que resultam também em parte dos dispositivos constitucionais em que colocam o titular, a que se adicionam a complexidade de presidir sem poder, numa era de globalização e com a crise a minar a Europa. Como figura decorativa, e isso tem ficado espelhado na adesão que suscitam os argumentos dos candidatos, a função presidencial merecia mais e melhor. Merecia mais e melhor empenho dos candidatos, explicando ao que vem, o que querem, como querem. Merecia mais interesse do gentio, questionando, interrogando, interessando-se.

Domingo, terminam dez anos de um ciclo que teve tudo o que de mau e impensável se podia conceber. Os ideais do rigor, interesse nacional, boa gestão financeira e integridade, que alguns acreditaram poderem ser princípios de Cavaco Silva, não passaram de uma ilusão. Os maiores acontecimentos dos seus mandatos, foram Sócrates como primeiro-ministro, um lote de processos-crime a governantes. As piores trapalhadas financeiras da nossa história e as maiores falências de bancos. Foram nos dez anos de Cavaco Silva que aconteceram a decadência, o endividamento, o pedido de assistência internacional, a estagnação, o desemprego e a emigração. A propaganda não escondeu a realidade que os Fundos Comunitários, que perdulário distribuiu pelos confrades, e afins, acabou por vir ao cima.

Domingo pode ser o fim de uma era? Pode(ia)… mas só 40 anos depois de Abril. Vá lá… vote. Decida-se!