Assinala-se este sábado, 27 de fevereiro, 129 anos da tragédia marítima do naufrágio que envolveu várias embarcações da Póvoa de Varzim e de Afurada. Nesse dia morreram mais de cem pescadores, 70 deles da comunidade poveira.
Todos os anos tem sido evocada a data com diversas iniciativas, com destaque para os dois últimos anos de 2019 e 2020, com a realização do Cortejo dos Fachos entre a Câmara Municipal da Póvoa de Varzim e a Igreja da Lapa. Este evento tem sido realizado no âmbito das comemorações dos 250 anos da Igreja da Lapa, na zona sul da cidade, e este ano não se realiza devido à pandemia e ao estado de emergência.
A tragédia descrita em livro poveiro
Sobre a tragédia marítima, António dos Santos Graça, na obra “Epopeia dos Humildes: para a história trágico-marítima dos poveiros” escreveu:
“A tragédia de 27 de Fevereiro de 1892 fez mergulhar em negro o garrido trajar poveiro. Não houve lar onde não entrasse o luto. Heroicidade, abnegação, de tudo houve nesse dia de angústia! A tempestade surpreendeu as lanchas no mar da Cartola a sudoeste de Aveiro. Duas lanchas, a do tio Praga e a do tio Jéque, caminhavam a par, apenas com uma latina, a caminho do norte. Tinham que seguir como Deus fosse servido, porque não havia força humana que as pudesse desviar do seu curso tempestuoso. Sem um minuto de descanso, os homens das companhas esforçavam-se para deitar fora a água, que as vagas alterosas teimavam em atirar para dentro das embarcações. Os mestres eram compadres e amigos. As companhas afoitavam-se mutuamente para não esmorecerem. Mas uma – a do mestre Jéque – pelas alturas de Esposende, encheu-se de água e soçobra; a outra tenta, mas não pode acudir-lhe. É o mestre da que naufraga que grita:
– ‘Não tentes o socorro, compadre, que morreis todos. Deus te guie e leve a salvamento! Leva o último adeus para as nossas mulheres e nossos filhos! Até à eternidade, compadre!’
O velho mestre João Praga levantou a mão num gesto de despedida mas não respondeu. Duas lágrimas rolaram-lhe pela face – mas ninguém mais lhe ouviu uma palavra. Leme bem firme, todo o dia e toda a noite até ao alvorecer do dia seguinte, em que entrou em Vila Garcia, na Espanha. Salvou a companha. Dois dias depois chegava à Póvoa, de comboio. Após a tragédia nunca mais comeu, nunca mais falou. Oito dias depois da sua chegada – morria! A grande dor de não poder salvar – matou-o!…”
Foto arquivo – José Novais 2019.