No Dia Mundial da Poesia, Aurelino Costa ‘Fala do poema’

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Foto: José Alberto Nogueira

“Em poesia, ou alargadamente, em Arte, o mínimo (mesmo que se trate da “exaltação do mínimo” de que fala Luiza Neto Jorge no poema Magnólia) é o processo alquímico, ainda que se dê pelo nome de acrescento.

António Gamoneda, no seu ensaio: Conicimiento, revelacíon, lenguages, afirma tal mínimo como componente máxima e incontornável para a existência do poema contemporâneo, aquele onde se encontram os resíduos da não-repetição.

 

Assim o Acto Poético, para o ser, tem de comportar uma “amplificacion de la realidad”, ou seja, tem de ter em conta igualmente uma espécie de linhagem poética para não repetir o que já foi dito/escrito, uma vez que esse reportório é uma parte substancial da realidade com que o poeta se confronta e lida com o desvínculo à temporalidade da circunstância pela sua transformação ( seja com os nomes de transferência no campo analítico ou de transcendência no campo do sagrado) profere a existência de uma dimensão reveladora que é inerente ao acto poético, ao acto de criação.”

 

 

Fala do poema

É comovente a tua poesia

chego a ter pena de ti e às vezes medo

Ardes-me na mão como uma brasa ao rubro

e eu sinto-a e apetece-me levá-la à boca, queimar-me.

Adorava que me visitasses mais vezes

tens um quarto cá em casa, louceiro, agasalho

e pão, ainda fresco, coberto com um pano, na maceira de pinho

aguardarei todos os dias, enquanto pascerei vacas até que venhas

e ordenharei úberes brancos, de leite branco e espumoso, meu poeta

não te esqueças, às vezes tenho fome, muita fome e o jejum mata-me.

Aurelino Costa, in ” DOMINGO NO CORPO “,Deriva Editores/Porto.

 

Aurelino Costa nasceu em Argivai, na Póvoa de Varzim, em dezembro de 1956. É licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.

O poeta e diseur poveiro conta com um alargado currículo artístico, que inclui obras como ‘Poesia Solar’ (1992), ‘Na Raiz do Tempo’ (2000), e ‘Pitões das Júnias’, com ilustrações de Anxo Pastor, (Ed. Fluviais e Galeria Arcana 2002 e Ed. Bluebook 2020).

É também autor de ‘Amónio’ (2003), com 2ª edição (bilingue, castelhano-português) tradução de Sílvia Zaias (2006), e 3ª edição, edições Húmus, em fevereiro deste ano. Assina, ainda, ‘Na Terra de Genoveva’ (2005), ‘Domingo no Corpo’ (2013), e ‘Gadanha’, edição Modo de Ler (2018), que foi nomeado para Prémio Autores SPA/2019, na categoria de Literatura-Melhor Livro de Poesia.

Colaborador em várias antologias, Aurelino Costa participou também em documentários, CD’s, cinema e televisão. Como diseur, venceu o Prémio Mineiro Poético, em 2011.

É associado da Associação Portuguesa de Escritores, da Associação Homens de Letras do Porto e do PEN Clube Português.