Vale a pena salvar a Humanidade? – Opinião de Pedro Macedo

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Apresento aqui uma boa lista de desculpas para não nos preocuparmos com o ambiente e em particular com as alterações climáticas. É só escolher uma e seguir em frente. Ou não.

Mudar dá trabalho, é incómodo, coloca-nos perante o incerto. Adoramos ritos e rituais, rotinas, mesmo que nefastas. Lembro-me daquele estudo em que se colocavam duas opções: prefere este sofrimento, a uma hora incerta do dia, com a possibilidade de nunca acontecer; ou um sofrimento certo e com hora marcada. A maior parte escolheu o sofrimento certo. Somos assim, animais de hábitos.

É esta a primeira desculpa para não fazermos nada para evitar a tragédia climática. Dá muito trabalho. É confuso e complexo. A boa notícia é que estamos aqui para ajudar, nós e muitos mais. Ainda agora abriu na Póvoa de Varzim um novo balcão de atendimento, o “Póvoa de Varzim Energy Hub”. Um espaço de apoio na área da eficiência energética e produção de energia renovável em ambiente residencial. A outra boa notícia é que mudar custa, mas dá muito prazer. É como ir de férias: temos que fazer marcações, fazer a mala, acordar cedo e perder horas na viagem… mas depois vem a recompensa. Que no caso da ação climática pode ser uma fatura mais baixa na energia e maior conforto térmico, além da resiliência acrescida.

Depois há quem ache que as alterações climáticas são uma coisa que se resolve numa Assembleia Geral das Nações Unidas. Pois, eu também achava que devia ser assim. Não faltam acordos e tratados, mas nenhum deles está a ser respeitado. A capa de um dos últimos relatórios sobre o clima é um disco riscado. Fala-se, fala-se, fala-se… e não se sai do mesmo sítio. Elucidativo. Meus caros, temos de ser nós a arregaçar as mangas, porque vamos ser nós a ter de lidar com as consequências da inação. Não vale a pena esperar por heróis.

E claro, há quem ache que tudo se irá resolver com alguma tecnologia miraculosa que faça desaparecer o dióxido de carbono da atmosfera. A boa notícia é que sim, essa tecnologia existe. Chamam-se árvores (e afins) mas cada vez são menos e mais ameaçadas. E simplesmente não temos, nem de perto nem de longe, os recursos ou o tempo para substituir 1500 milhões de automóveis por viaturas elétricas (etc. etc.). Temos de mudar de estilo de vida, consumir menos, confiar no bom senso e não na tecnologia.

Mas há desculpas muito mais rebuscadas. Há quem acredite que isto das alterações climáticas é tudo uma conspiração para controlar a Humanidade. Se alguém se atreve a falar de uma “cidade de 15 minutos” – onde todos os serviços públicos estejam, no máximo, a 15 minutos de distância a pé, de transportes públicos, ou de outras formas de mobilidade suave como a bicicleta – é porque é um ditador que quer limitar as liberdades individuais. Porque para alguns o conceito de liberdade talvez seja andar de SUV para todo o lado, nem que isso signifique passar horas numa fila de trânsito.

No meu processo de investigação descobri, tragicamente, que a verdadeira razão profunda para tantos não cuidarem do Planeta que nos sustém, é simplesmente não acreditarem que vale a pena salvar a Humanidade. Acreditam que o Homo sapiens tem algum defeito que inevitavelmente nos irá levar à extinção. Que a crise ecológica (moral, etc.) é irremediável. Que irá acabar tudo em barbárie, como é retratado em tantos e tantos filmes. Pura misantropia.

No Centro do Clima acreditamos que temos de mudar, sim. Mudar os nossos sistemas, que promovem o pior do ser humano, o seu individualismo e consumismo. Mas acreditamos que precisamos acima de tudo de mais Humanidade, de enaltecer o que de melhor temos, a nossa motivação intrínseca para fazer o bem, para cuidarmos uns dos outros, da nossa Casa. A nossa capacidade para nos adaptarmos e resistirmos, para sermos curiosos e criativos.

E sim, também temos medo. Vivemos todos os dias com a angústia de ter de lidar com tantas dificuldades e acusações. Medo de já ser tarde demais. Medo que se transforma facilmente em raiva e desespero. Mas sabemos que não adianta construir “bunkers” ou esperar salvações divinas. Recusamo-nos a perder a esperança e não deixamos que o insidioso medo nos domine. Queremos ir mais além do cabo das tormentas. Sim, vale a pena ‘salvar’ a Humanidade.

Vêm aí várias eleições. Que o nosso voto seja informado e consciente. Que venha de um lugar de esperança e não de medo. Como dizem os velhos sábios, o medo nunca foi um bom conselheiro.

Pedro Macedo, coordenador do Centro do Clima da Póvoa de Varzim e embaixador do Pacto Europeu para o Clima

Escondido em cada negacionista das alterações climáticas há provavelmente um misantropo, alguém que acredita que o Planeta fica melhor sem a Humanidade.

As capas dos últimos relatórios das Nações Unidas são elucidativas. O discurso das alterações climáticas parece um disco riscado – as temperaturas continuam a subir, mas continuamos a aumentar as emissões de gases com efeito de estufa. A nossa casa está a arder e nós não estamos preparados.

Artigo de Opinião de Pedro Macedo