“A pesca acaba se não houver mudança de política”

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O alerta é de Manuel Marques, presidente da Associação de Armadores de Pesca do Norte (AAPN). A falta de mão de obra, as constantes reduções na quantidade de captura permitida e as elevadas despesas com as embarcações estão a deixar o setor de pesca em situação precária

Manuel Marques diz que é cada vez mais difícil atrair novas pessoas para a atividade piscatória. “É uma profissão pouco promovida e má vista”, lamenta. “Ao longo dos anos tem perdido bastante poder, ou seja, começa a faltar um ordenado regular e que seja capaz de sustentar o pescador. As quotas têm diminuído mas as despesas mantêm-se. Se não houver uma mudança de política, a pesca acaba. Se conseguirmos alguma mudança, por pequena que seja, então poderá melhorar”.

A FORMAR, Centro de Formação Profissional das Pescas e do Mar, vai arrancar em breve com duas turmas de 15 alunos para tirarem a cédula, um número “baixo”, segundo Manuel Marques. Tem que se fazer mais para “cativar os jovens”, até porque há uma vantagem neste setor: “trabalho garantido”, lembra o vila-condense.

Relacionado com estes problemas está o facto de não haver ainda confirmação, da Direção-Geral das Pescas, acerca dos abates das embarcações nos próximos anos. Devido à falta de mão de obra, muitos barcos estão parados, o que acarreta grandes custos.

“Muitos pescados já não estão a retirar rentabilidade. Têm falta de mão de obra, não há pessoal para trabalhar e por isso as embarcações estão paradas. Além disso, ao longo dos anos têm vindo a ser reduzidas as quotas de captura permitida, ao passo que as embarcações se mantêm sempre as mesmas. Praticamente não dá para cobrir as despesas”, sublinha o líder da AAPN, que representa sobretudo a pesca artesanal.

“A nossa ideia é abater 20 a 30% da frota, aumentando a percentagem de peixe que cada barco apanha. Neste momento existem demasiadas embarcações em comparação com o peixe que é possível capturar”.

Os abates carecem de autorização estatal, e incluem regalias, uma vez que são vistos como uma forma de recuperação do setor. E, para poderem ser admitidas a, abate é preciso as embarcações terem um número mínimo dias de trabalho.

Também a atual fase desconfinamento dos restaurantes e estabelecimentos ainda não se faz sentir para os homens do mar: “O valor do pescado em lota está praticamente ao mesmo nível de 2020 e cerca de 30% abaixo dos últimos cinco anos”, lamenta.

Grupo de trabalho para resolver questão das fiscalizações laborais

Recentemente, os pescadores da região norte fizeram uma greve de alguns dias em protesto com a “fiscalização excessiva” por parte da GNR, que exigia, por exemplo, mapas de férias e horários detalhados num setor de atividade que nem sempre pode seguir esse tipo de rigor formal. Depois de duas reuniões com o governo, o problema parece estar controlado.

“Tem estado mais calmo, a Unidade de Controlo Costeiro continua a fazer fiscalizações mas agora são as normais”, explica Manuel Marques. “Já não perguntam sobre o plano de férias ou horários de trabalhos, perceberam que não havia necessidade de fazer isso”.

Na sequência das reuniões, “foi criado um grupo de trabalho – envolvendo pescadores, governo e forças de segurança – para chegarmos a um consenso sobre um plano de férias e horário de trabalho. Até isso acontecer, o que poderá demorar um ano, estas fiscalizações laborais estão suspensas, mantendo-se apenas as de rotina”.

Pesca deve aproveitar tradição turística da Póvoa

A associação de armadores liderada por Manuel Marques, bem como várias outras entidades da região ligadas à pesca, consideram que o setor deve aproveitar melhor a forte componente turística que existe na Póvoa de Varzim. O novo pólo da marina, de resto, é um passo em frente nessa direção, sendo que o ideal será também construir ali mais bares e restaurantes, sugere.

Manuel Marques é da opinião de que o porto da Póvoa é atualmente um pouco “confuso”, com “algumas embarcações de pesca e recreio atracarem a norte e outras a sul”, disse.

A solução seria “a pesca profissional passar para o sul, para perto dos armazéns, fazendo-se ali também alguns cais de atracagem”, perspetivou. “Já a norte fica então a nova marina, perto do centro e do Casino”.

Sem surtos de covid nas embarcações

Nem tudo são más notícias, porém, e, de acordo com Manuel Marques, nos últimos dois meses, pelo menos, “nenhuma embarcação parou por causa da covid nem houve qualquer surto”, revelou.

Também positivo é o diploma recentemente publicado em Diário da República, determinando que os profissionais da pesca podem pedir até outubro uma reavaliação dos requerimentos de pensão de velhice antecipada, ou por desgaste físico, indeferidos por não cumprimento do tempo de serviço.

Foto arquivo