Algumas considerações sobre o Rol dos devedores à Igreja

0
1233

Rol das Bulas que se deram fiadas até o S. Miguel nesta igreja de Argevai, que pagarão a Manuel Pires Peneirado (*).

No artigo deste mês, vou tecer algumas considerações possíveis sobre este
documento. O livro está muito deteriorado, com várias folhas rasgadas, tornando-se de difícil leitura. Data de entre 1566 a 1612, e encontra-se riscado na sua grande parte. De qualquer forma, há alguns pontos que podem ser aqui analisados.

Sabemos que bula poderia ser um documento ou um decreto, com selo de Papas ou de Soberanos, em ouro, prata ou chumbo, atestando assim a sua autenticidade. Ou poderia ser um documento pontifício escrito em pergaminho com selo papal, gravado em chumbo ou cera. Podia ainda ser uma dispensa de certas práticas religiosas, concedidas por bispos.

Neste caso, em particular, dizia respeito à listagem dos fregueses que receberam indulgências a crédito, provavelmente relativas às bulas da Santa Cruzada. Estas tinham de ser pagas, até a Festa de S. Miguel, padroeiro da freguesia de Argivai, ou seja até 29 de setembro. Curiosa a escolha desta data. Não nos esqueçamos que a festa religiosa de
S. Miguel coincide com as atividades cíclicas da vida agrícola. Aliás no Norte, associase o nome deste santo, ao período do final das colheitas, em que deviam ser pagas as rendas e revistas as contas. “Pelo São Miguel”, expressão muito utilizada no mundo rural, para o fim do verão e início do outono.

A igreja de Argivai surge neste documento das bulas como igreja de Argevai, o que é perfeitamente compreensível, se tivermos em atenção a data do documento. Sendo uma variante do nome pelo qual é atualmente conhecida – Argivai.

Assim, os habitantes e devotos da igreja deviam acertar as suas contas com Manuel Pires que recebendo as quantias em falta, riscava no documento, comprovando assim o seu respetivo pagamento. Este Manuel Pires tinha como alcunha na freguesia o peneirado. Manuel Pires poderia muito bem pertencer às primeiras famílias de caseiros ou lavradores de Argivai. O sobrenome Pires surge no Tombo de Argivai de 1589.

Aparece associado a testemunhas na feitura do Tombo, pois este documento precisava de ser confirmado por homens bons, discretos, espertos e antigos bem conhecedores de todas as propriedades e terras da freguesia. Neste mesmo tombo aparecem como testemunhas os lavradores: Gonçalo Gomes e João Pires, e como caseiros: Duarte
Afonso, Inácio Fernandes, Manuel Pires, Pedro Pires. Seria este Manuel Pires, o peneirado? Talvez possamos descobrir mais à frente.

Sabemos com certezas que Pires o peneirado, responsável pelo cumprimento dos pagamentos das bulas, faleceu nesta freguesia de Argivai a 26 de março de 1618, tendo recebido todos os sacramentos da
Santa Igreja.

Sofia Teixeira

(*) A.D.P Sec. Registo Civil. Concelho da Póvoa de Varzim. Freguesia de Argivai (S. Miguel) 1566 a 1662. Livro M. Nº 1 – Rol das
Bulas que se deram fiadas até o S. Miguel nesta igreja de Argevai, que pagarão a Manuel Pires Peneirado.